Avanços do Planejamento Espacial Marinho do Brasil são apresentados em workshop internacional

Os avanços do Governo brasileiro para a implantação do Planejamento Espacial Marinho (PEM) foram apresentados no workshop promovido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e o Instituto Italiano para a Proteção e Pesquisa Ambiental (Ispra), de 29 a 31 de outubro, em Roma, Itália. O PEM é um instrumento orientador para o uso sustentável dos recursos do oceano e das áreas costeiras. Durante a Conferência da ONU para os Oceanos (2017), o Brasil assumiu o compromisso voluntário de implantá-lo até 2030. As ações estão sendo conduzidas pela Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), que conta com 18 instituições/ministérios em sua composição, sendo coordenada pelo comandante da Marinha do Brasil.

O workshop reuniu 30 participantes – sendo 15 especialistas convidados – representando diferentes países. Durante os três dias, foram discutidas estratégias para integrar a aquicultura em estruturas de planejamento espacial marítimo ou costeiro, tanto novas quanto existentes. Através da troca de conhecimentos e experiências, os participantes buscaram identificar os desafios e as oportunidades na implementação do planejamento espacial em diferentes regiões costeiras, com enfoque principal na aquicultura. 

Pelo Brasil, a chefe-adjunta de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Territorial, Lucíola Magalhães, demonstrou como o Governo Brasileiro, por meio do exemplo da Embrapa, atua na geração e compartilhamento de dados e informações sobre a aquicultura brasileira, no intuito de apoiar a tomada de decisão e análises espaciais diversas. Convidada pela FAO/Ispra para representar o País, Magalhães possui larga experiência no planejamento espacial.

Os participantes contribuíram com reflexões e sugestões em cinco áreas prioritárias: “Governance and institutional framework: streamlining interactions between authorities; Knowledge support for spatial planning in aquaculture; Criteria and guiding elements for allocation of space, co-use of marine space, land and sea interactions and adaptation to climate change; Capacity building, awareness and capacity expansion e Marine conservation and restoration”. Para cada uma dessas áreas prioritárias, foram definidos os principais objetivos, as principais ações, possíveis responsáveis pela execução das ações e os stakeholders nestas áreas, além de outras informações. 

As contribuições vão gerar o Maritimal Spatial Planning roadmap for aquaculture, um roteiro detalhado e bem estruturado que servirá como um documento orientador para ajudar os países a desenvolver e aplicar processos de planejamento espacial especificamente para a aquicultura, para facilitar a alocação de espaço para a aquicultura de forma sustentável, equilibrando fatores ambientais, econômicos e sociais. O documento deve ser publicado pela FAO no próximo ano.

Aquicultura no Brasil

Magalhães explicou que o Planejamento Espacial Marinho do Brasil considerará as informações depositadas na Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Inde), ambiente onde as informações geoespacias produzidas pelas instituições de governo brasileiras estão catalogadas, integradas e acessíveis para a sociedade. Dando um exemplo de tecnologia desenvolvida com o propósito de compilar e compartilhar dados para reuso em políticas e outras pesquisas, a cientista apresentou o SITE Aquicultura, um sistema de inteligência territorial que organiza os dados da cadeia produtiva e os disponibiliza, de modo a estarem acessíveis para pesquisas e outras análises.

Ao analisar o panorama da aquicultura no Brasil, ela compartilhou números que revelam a expansão crescente da atividade no território brasileiro. Segundo a Pesquisa de Produção Agrícola, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2023, o desenvolvimento da atividade aquícola foi registrado em 3.486 municípios (ou 63% dos municípios brasileiros), gerando um montante de 10,15 bilhões de reais. E não para por aí. Entre 2016 e 2023, dados de diferentes instituições nacionais, como Peixe BR e Associação Brasileira de Criadores de Camarão, mostraram um crescimento de 39% na aquicultura e de cerca de 200% na produção de camarão.

A maior concentração destes polos se encontra no interior do País, como demonstram as análises realizadas pela Embrapa Territorial. Por meio de técnicas de sensoriamento remoto, o centro de pesquisa identificou onde estão os principais polos de produção aquícola no território nacional, considerando o G75 de cada estado. Dentro de um raio de 50 km da linha costeira brasileira, foram identificados 6.111 viveiros escavados, o que representa apenas 2,9% da área total dos viveiros mapeados. Ao considerar os municípios da zona costeira, definição dada pelo IBGE, essa área mapeada é um pouco menor, apenas 2,3%. “Esses resultados reforçam que a atividade aquícola no Brasil é, em sua maioria, praticada no interior. No entanto, ela é particularmente importante para alguns estados, como o Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Sergipe no Nordeste, além de Espírito Santo e Santa Catarina, nas regiões Sudeste e Sul”, comentou.

Magalhães observa que o número real de viveiros na Zona Costeira Brasileira pode ser consideravelmente maior, pois a metodologia adotada nos primeiros trabalhos considerou apenas o G75, sendo, portanto, necessária uma pesquisa adicional para contemplá-los integralmente.

Pequenos produtores e conservação ambiental 

A inclusão dos pequenos produtores aquícolas nas discussões do planejamento espacial marinho foi outro ponto destacado em sua apresentação. A cientista enfatizou que, enquanto os dados relativos à aquicultura praticada por grandes empresas são facilmente encontrados nos registros oficiais, a pequena aquicultura, muitas vezes associada à produção familiar, é despercebida pelo Estado Brasileiro. Segundo a cientista, o sensoriamento remoto será uma ferramenta importante para mapear e reconhecer essas comunidades. 

A representante do Brasil também destacou as relações espaciais entre a produção aquícola na zona costeira e as áreas de proteção ambiental. “38% das estruturas mapeadas por sensoriamento ocorrem dentro de áreas de proteção ambiental, especialmente de uso sustentável. Esse tipo de análise é relevante uma vez que o Brasil possui inúmeras Unidades de Conservação (UCs) na zona costeira, e uma gestão territorial eficiente precisa considerar os diferentes tipos de uso atuais e demandas futuras para uso do espaço e suas implicações ambientais em outros sistemas”, enfatizou. 

Tendências 

Durante o workshop, a cientista se surpreendeu ao perceber o alinhamento entre os países na geração, análise e a publicização dos dados em plataformas web. Os países mostraram práticas semelhantes de como trabalham com modelagem espacial de dados, como adotam metodologias para identificação de áreas prioritárias para a atividade aquícola marinha costeira e como vem publicizando estes dados, deixando-os à disposição dos gestores e da sociedade. “Os métodos e as técnicas de trabalho que adotamos são amplamente utilizadas ao redor do mundo. Estamos alinhados com as principais tendências globais de instituições de pesquisas e alguns governos na geração e compartilhamento de dados”, avaliou.

Como desafio de pesquisa, ela cita os impactos das mudanças climáticas no planejamento espacial da aquicultura, não só em relação às áreas alocadas atualmente, mas na alocação de áreas futuras para a aquicultura e os potenciais conflitos com mudanças de uso da terra que podem surgir por conta dessas alterações. “Modelar esses impactos foi um dos grandes desafios de pesquisa mencionados em conjunto pelos especialistas”, disse. 

PEM 

A estruturação PEM do Brasil está no início e conta com financiamento do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Fundo Brasileiro para a Diversidade (Funbio). Dada a extensão territorial da costa brasileira (8 mil km² e área marítima de 5,7 milhões de km²), a CIRM compartimentou a estruturação do PEM em quatro regiões: Sul, Sudeste, Nordeste e Norte. “A região Sul está em estágio mais avançado e servirá como piloto, no qual as melhores práticas e lições aprendidas serão exportadas para o PEM das outras regiões”, informou Magalhães.  

Fonte: Embrapa Territorial

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