Documentário mostra como indígenas extraem sal da planta de aguapé

Diz uma lenda do povo Waurá, da região do Alto Xingu (MT), que certo dia um índio saiu para pescar e encontrou um local onde havia muitas plantas de aguapé. Ele achou a flor muito bonita e pensou: “Se essa flor fosse uma mulher, eu me casava com ela”.

Quando ele voltou da pescaria, já em casa, à noite, uma mulher apareceu chamando por ele lá fora. O rapaz saiu e viu uma mulher muito bonita que falou: “Você disse que me achou bonita. Eu sou a flor de aguapé. Você me apaixonou e eu estou aqui para me casar com você”.

No dia seguinte, toda família do rapaz foi trabalhar na roça enquanto a mulher-aguapé ficou em casa preparando a comida. Mas, para temperar o alimento, ela urinou numa cuia e jogou na comida. Quando o pessoal voltou da roça, a comida estava pronta. Todos comeram e gostaram muito.

Mas no outro dia, uma das cunhadas da mulher-aguapé ficou em casa, e viu quando ela colocou urina na comida. A cunhada contou para a família e todos começaram a pressionar a mulher-aguapé, para saber por que ela tinha feito aquilo.

A mulher-aguapé ficou muito triste e pediu para o esposo voltar com ela ao mesmo local da pescaria. Chegando lá, ela disse que ia embora, porque todos na casa haviam brigado com ela. Aí ela pulou na água e já se transformou na planta do aguapé novamente.

E foi assim que o povo Waurá aprendeu a extrair sal da folha de aguapé.

Essa e outras histórias estão em um documentário produzido pelo pesquisador Fábio de Oliveira Freitas, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF). O filme tem cerca de 20 minutos e deve ser lançado em maio. A direção é de Celso Viviane e as imagens e edição da produtora Rentalpix.

Produção

Para produzir o documentário, a equipe ficou 10 dias, entre julho e agosto do ano passado, na aldeia Ulupuwene, do povo Waurá, no Alto Xingu. “Ficamos numa área de transição entre o Cerrado e Amazônia, apesar de a área já ser considerada Amazonia Legal”, explica Freitas.

O pesquisador conta que eles se hospedaram na própria aldeia, acompanhando o dia a dia da comunidade. “Focamos não apenas no aspecto técnico da produção de sal, mas também no aspecto cultural”, enfatiza.

Freitas destaca que o sal é um alimento/condimento dos mais utilizados pelo ser humano há milhares de anos, sendo utilizado inclusive como moeda de troca em muitas sociedades ao longo da história e mesmo recentemente. “Salário, por exemplo, vem da palavra sal”, esclarece o pesquisador, lembrando que ele é usado ainda para fins medicinais e mesmo na conservação de alimentos.

“Ocorre que em muitas regiões do planeta o acesso a ele é difícil. Desse modo, algumas sociedades e populações tradicionais desenvolveram diferentes estratégias para produzi-lo a partir de determinadas plantas, como é o caso de algumas etnias indígenas do Alto Xingu, que aprenderam a produzir sal a partir do processamento de plantas de aguapé”, assinala Freitas.

Resgate

De acordo com ele, um dos objetivos do documentário é justamente resgatar a importância dessa tradição ainda preservada pelo povo Waurá. “Mas que está cada vez mais difícil encontrar quem ainda a pratica, em parte pela facilidade crescente de obtenção do sal da cidade”, esclarece.

Além do problema de erosão cultural, essa substituição traz riscos também à saúde dos indígenas, pois o sal do aguapé é composto por KCl (Cloreto de Potássio), que não causa problema de hipertensão como o comercial, feito de NaCl (Cloreto de Sódio).

Confira abaixo um teaser que mostra um pequeno resumo do documentário, que foi produzido com recursos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).

Fonte: Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia

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